quinta-feira, 15 de junho de 2017

SENTENÇA ALTERNATIVA




O advogado e escritor Francisco Marcos Araújo publicou excelente biografia sob o título de “Cícero, o Semeador da Fé e Justiça: Uma Biografia de Cícero Alves de Sousa”.

Começada a leitura do poeta cordelista Antônio Francisco, não se consegue parar até o final do livro. O prefácio é do nobre e competente juiz Madson Ottoni de Almeida Rodrigues. Nota-se absoluta precisão vocabular do autor. Sintam a força do cordelista:

SEMEANDO A JUSTIÇA

Cícero foi temperado na queimada
Das caatingas do chão paraibano
Engolindo poeira e desenganos
Nos sopapos do cabo da enxada.
Mas poliu de vontade a sua estrada
Com o seu sentimento mais profundo
Não parou de caçar um só segundo
A espada amolada da Justiça

Pra lutar contra a mão da injustiça
Que destrói a essência deste mundo
Foi um jovem de força e de coragem
Um herói, um cigano, um beduíno
Um gigante com rosto de menino
Entre os bicos de pedras da rodagem

Foi ferreiro forjando a própria imagem
Um açude sangrando de amizade
Um riacho cantando de saudade
Um cacique regendo a sua aldeia
E agora é um mestre de mão cheia
Adoçando o licor da humanidade.

O livro conta a história do juiz Cícero Alves de Souza, ex-seminarista, em Catolé do Rocha, erudito juiz e professor de Direito em Mossoró. Buscava Justiça, um homem dedicado e cordial com todos. Muitas vezes, as suas sentenças não eram aceitas pelo Tribunal por falta de fundamentação legal. Muito antes dos juízes paranaenses, avant la lettre, ele dava sentenças alternativas.

Relato uma das suas sentenças. Três rapazes de Grossos, embriagados, roubaram um casal de velhos. Além de um revólver, o produto do furto daria para comprar vacas. No dia seguinte, sóbrios, arrependeram-se e devolveram o produto roubado. O delegado não quis conversa. Prendeu-os e remeteu o inquérito para o Dr. Cícero. A sentença surpreendeu. Foram condenados a assistir, por quarenta domingos seguidos, a missas na primeira fila da igreja. O pároco deveria atestar as presenças.

O autor da biografia pesquisou e descobriu que os três, depois da sentença, nunca deixaram de trabalhando e viver regularmente. Um deles era zelador da igreja.




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