domingo, 25 de junho de 2017

O TOQUE DOS SINOS




“É conveniente que haja em cada igreja um ou mais sinos para convocar os fiéis aos ofícios divinos e religiosos”, determinava o Direito Canônico, de 1917 (cânon 1169). O saudoso amigo Oswaldo Lamartine, em sua sabedoria e erudição, afirmava: “os sinos de nossos templos falam”. Solicitou-nos, certa feita, que publicássemos algo a esse respeito. Temos colhido dados sobre a origem dos campanários, seu significado e importância. Já dissera o autor da Eneida: “Forsan et haec olim meninisse iuvabit” (Talvez, um dia seja agradável recordar estas coisas). Nosso querido Dom Nivaldo nutria idêntico sentimento e sugeria-nos o tema para estudo. Com seus toques, os sinos têm uma linguagem peculiar e rica no tocante às modalidades e aos significados, ainda conhecidos de alguns fiéis. Dom Adauto de Miranda Henriques, quando bispo da Paraíba e do Rio Grande do Norte, registrou no Livro de Tombo de uma freguesia potiguar que “uma paróquia deveria ter duas torres e, no mínimo, dois carrilhões”. Pequenos, médios e grandes, com sons e timbres variados, entre graves e agudos, costumam transmitir mensagens. Pelos repiques, dobres e toques, indicam qual solenidade acontecerá: procissão, novena, bênção do Santíssimo, hora da missa e até seu celebrante. Pelos toques fúnebres toma-se conhecimento da pessoa falecida: homem ou mulher, leigo ou eclesiástico.

Ainda jovem, ouvíamos narrações dos sacristãos de Jucurutu (Abdias e Chico Justino), Caicó (Zé do Padre), Acari (Abílio Córdula) e Mossoró (Raimundo, acólito de Monsenhor Mota). Foram informações preciosas – semelhantes às das tradições mineiras – sobre aquilo que chamavam de “ciência dos sinos”.

Distinguem-se repiques e toques. Estes são subdivididos entre dobre simples (quando o sino cai para o lado em que se puxa o badalo), ocasionando uma só pancada em cada movimento; dobre duplo (quando cai pelo lado contrário onde o badalo é puxado), proporcionando duas badaladas em cada movimento. O repique acontece, quando o toque é feito intermitentemente com o badalo, mas o sino parado. No passado, eram reconhecidos como meio de comunicação e cronômetro da cidade. Uma igreja matriz costumava ter acoplado aos sinos um relógio, que marcava as horas, orientando os cidadãos nas lides diárias. Anunciavam os eventos religiosos e litúrgicos. Ao longo dos anos, criou-se um ritual para repiques, dobres e toques.

Destarte, quando da celebração da Eucaristia, procedia-se a “chamada”, sessenta, trinta e quinze minutos antes da cerimônia. Os fiéis eram avisados da seguinte maneira: tocava-se o sino grande com doze badaladas, em homenagem aos apóstolos de Cristo. Em seguida, os toques espaçados indicavam quem seria o celebrante (sete, o bispo diocesano; cinco um sacerdote visitante e três, o pároco). Diga-se, de passagem, naqueles sertões longínquos, os fiéis tinham familiaridade com essa linguagem. Na missa, dava-se uma badalada em cada sino na hora da consagração e quando o cálice era elevado, fazia-se o repique. Da mesma forma, procedia-se na benção do Santíssimo Sacramento, quando o celebrante apresentava o ostensório.

A tradição definiu outros procedimentos. Por exemplo, dez badaladas, nas chamadas para as procissões, batizados, confissões, novenas etc. Dispõe-se também de um rito próprio para os funerais. Quando se trata de um homem, o sineiro toca três dobres duplos no sino grande e para as mulheres igual quantidade, no pequeno. No caso de crianças de menos de sete anos, não acontecem toques ou dobres, e sim repique, pois se acredita que sejam anjos, subindo aos céus. No falecimento do papa, dobres de hora em hora; na morte de um bispo, de três em três horas; de quatro em quatro, ao falecer o pároco (vigário) e de seis em seis, no óbito de algum sacerdote da diocese, que tenha exercido o ministério na paróquia. Os dobres para papa, bispo e vigário são alternados no sino grande e no pequeno. São doze para o Sumo Pontífice, dez para os bispos e sete para os presbíteros.

Para a oração do Ângelus, os sinos tocavam, às seis, doze e dezoito horas. Além dos momentos e ocasiões acima descritos, também anunciavam catástrofes. Nesses casos, os toques eram desordenados, simbolizando o tumulto. Os sinos tinham um papel significativo na vida do Povo de Deus, apregoando momentos relevantes. Daí, o salmista proclamar: “Louvai o Senhor com instrumentos sonoros e retumbantes” (Sl 150, 5).


Padre JOÃO MEDEIROS FILHO




Nenhum comentário:

Postar um comentário