“É conveniente que
haja em cada igreja um ou mais sinos para convocar os fiéis aos ofícios divinos
e religiosos”, determinava o Direito Canônico, de 1917 (cânon 1169). O saudoso amigo Oswaldo
Lamartine, em sua sabedoria e erudição, afirmava: “os sinos de nossos templos falam”. Solicitou-nos, certa feita, que
publicássemos algo a esse respeito. Temos colhido dados sobre a origem dos
campanários, seu significado e importância. Já dissera o autor da Eneida:
“Forsan et haec olim meninisse iuvabit” (Talvez, um dia seja agradável recordar
estas coisas). Nosso querido Dom Nivaldo nutria idêntico sentimento e sugeria-nos
o tema para estudo. Com seus toques, os sinos têm uma linguagem peculiar e rica
no tocante às modalidades e aos significados, ainda conhecidos de alguns fiéis.
Dom Adauto de Miranda Henriques, quando bispo da Paraíba e do Rio Grande do
Norte, registrou no Livro de Tombo de uma freguesia potiguar que “uma paróquia
deveria ter duas torres e, no mínimo, dois carrilhões”. Pequenos, médios e
grandes, com sons e timbres variados, entre graves e agudos, costumam
transmitir mensagens. Pelos repiques, dobres e toques, indicam qual solenidade acontecerá:
procissão, novena, bênção do Santíssimo, hora da missa e até seu celebrante. Pelos
toques fúnebres toma-se conhecimento da pessoa falecida: homem ou mulher, leigo
ou eclesiástico.
Ainda jovem, ouvíamos
narrações dos sacristãos de Jucurutu (Abdias e Chico Justino), Caicó (Zé do
Padre), Acari (Abílio Córdula) e Mossoró (Raimundo, acólito de Monsenhor Mota).
Foram informações preciosas – semelhantes às das tradições mineiras – sobre aquilo
que chamavam de “ciência dos sinos”.
Distinguem-se
repiques e toques. Estes são subdivididos entre dobre simples (quando o sino
cai para o lado em que se puxa o badalo), ocasionando uma só pancada em cada
movimento; dobre duplo (quando cai pelo lado contrário onde o badalo é puxado),
proporcionando duas badaladas em cada movimento. O repique acontece, quando o toque
é feito intermitentemente com o badalo, mas o sino parado. No passado, eram
reconhecidos como meio de comunicação e cronômetro da cidade. Uma igreja matriz
costumava ter acoplado aos sinos um relógio, que marcava as horas, orientando
os cidadãos nas lides diárias. Anunciavam os eventos religiosos e litúrgicos.
Ao longo dos anos, criou-se um ritual para repiques, dobres e toques.
Destarte, quando da
celebração da Eucaristia, procedia-se a “chamada”, sessenta, trinta e quinze
minutos antes da cerimônia. Os fiéis eram avisados da seguinte maneira: tocava-se
o sino grande com doze badaladas, em homenagem aos apóstolos de Cristo. Em
seguida, os toques espaçados indicavam quem seria o celebrante (sete, o bispo
diocesano; cinco um sacerdote visitante e três, o pároco). Diga-se, de passagem,
naqueles sertões longínquos, os fiéis tinham familiaridade com essa linguagem. Na
missa, dava-se uma badalada em cada sino na hora da consagração e quando o
cálice era elevado, fazia-se o repique. Da mesma forma, procedia-se na benção
do Santíssimo Sacramento, quando o celebrante apresentava o ostensório.
A tradição definiu outros
procedimentos. Por exemplo, dez badaladas, nas chamadas para as procissões,
batizados, confissões, novenas etc. Dispõe-se também de um rito próprio para os
funerais. Quando se trata de um homem, o sineiro toca três dobres duplos no
sino grande e para as mulheres igual quantidade, no pequeno. No caso de crianças
de menos de sete anos, não acontecem toques ou dobres, e sim repique, pois se acredita
que sejam anjos, subindo aos céus. No falecimento do papa, dobres de hora em
hora; na morte de um bispo, de três em três horas; de quatro em quatro, ao
falecer o pároco (vigário) e de seis em seis, no óbito de algum sacerdote da
diocese, que tenha exercido o ministério na paróquia. Os dobres para papa, bispo
e vigário são alternados no sino grande e no pequeno. São doze para o Sumo
Pontífice, dez para os bispos e sete para os presbíteros.
Para a oração do Ângelus,
os sinos tocavam, às seis, doze e dezoito horas. Além dos momentos e ocasiões
acima descritos, também anunciavam catástrofes. Nesses casos, os toques eram
desordenados, simbolizando o tumulto. Os sinos tinham um papel significativo na
vida do Povo de Deus, apregoando momentos relevantes. Daí, o salmista proclamar:
“Louvai o Senhor com instrumentos sonoros e retumbantes” (Sl 150, 5).
Padre JOÃO MEDEIROS FILHO
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