quarta-feira, 29 de setembro de 2021

AFIAR INFLUI NA ARTE DE TECER


 

Minucioso trabalho de Alice Spíndola sobre “A Faca pelo Fio” (1999), do poeta carioca Reynaldo Valinho Alvarez, que partiu recentemente. Mais que o desvendar um livro, o ensaio traça um sensível e arguto panorama criativo de um bom poeta. Com sábia delicadeza, e sem nunca abandonar o seu honrado propósito, a autora conduz o leitor ao universo poético urbano da humana paixão: ética, memória e insubmissão. Obra essencial para valorizar o potencial de Valinho Alvarez.




terça-feira, 28 de setembro de 2021

ESTRELA GUIA


 



A CASA DAS LETRAS – Volume 1


 

Prêmio Veríssimo de Melo, esta nova obra do escritor Thiago Gonzaga traduz manifestações literárias do Rio Grande do Norte, reunindo artigos publicados em jornais sobre alguns membros da Academia Norte-rio-grandense de Letras, entre eles Diogenes da Cunha Lima, Manoel Onofre Jr., Diva Cunha e Nelson Patriota. O livro ajuda a conhecer melhor o mundo literário e pessoal desses escritores dedicados e talentosos. É mais um passo, em linguagem acessível, em direção ao universo da literatura potiguar, do relevante e persistente trabalho de pesquisa do autor. Thiago Gonzaga é dos bons que fazem carreira sem alarde.




sexta-feira, 17 de setembro de 2021

PÁTRIA MINHA

Tarsila do Amaral, 1929

 

PÁTRIA MINHA

VINICIUS de MORAES
 
A minha pátria é como se não fosse, é íntima
Doçura e vontade de chorar; uma criança dormindo
É minha pátria. Por isso, no exílio
Assistindo dormir meu filho
Choro de saudades de minha pátria.
 
Se me perguntarem o que é a minha pátria, direi:
Não sei. De fato, não sei
Como, por que e quando a minha pátria
Mas sei que a minha pátria é a luz, o sal e a água
Que elaboram e liquefazem a minha mágoa
Em longas lágrimas amargas.
 
Vontade de beijar os olhos de minha pátria
De niná-la, de passar-lhe a mão pelos cabelos...
Vontade de mudar as cores do vestido (auriverde!) tão feias
De minha pátria, de minha pátria sem sapatos
E sem meias, pátria minha
Tão pobrinha!
 
Porque te amo tanto, pátria minha, eu que não tenho
Pátria, eu semente que nasci do vento
Eu que não vou e não venho, eu que permaneço
Em contato com a dor do tempo, eu elemento
De ligação entre a ação e o pensamento
Eu fio invisível no espaço de todo adeus
Eu, o sem Deus!
 
Tenho-te no entanto em mim como um gemido
De flor; tenho-te como um amor morrido
A quem se jurou; tenho-te como uma fé
Sem dogma; tenho-te em tudo em que não me sinto a jeito
Nesta sala estrangeira com lareira
E sem pé-direito.
 
Ah, pátria minha, lembra-me uma noite no Maine, Nova Inglaterra
Quando tudo passou a ser infinito e nada terra
E eu vi alfa e beta de Centauro escalarem o monte até o céu
Muitos me surpreenderam parado no campo sem luz
À espera de ver surgir a Cruz do Sul
Que eu sabia, mas amanheceu...
 
Fonte de mel, bicho triste, pátria minha
Amada, idolatrada, salve, salve!
Que mais doce esperança acorrentada
O não poder dizer-te: aguarda...
Não tardo!
 
Quero rever-te, pátria minha, e para
Rever-te me esqueci de tudo
Fui cego, estropiado, surdo, mudo
Vi minha humilde morte cara a cara
Rasguei poemas, mulheres, horizontes
Fiquei simples, sem fontes.
 
Pátria minha... A minha pátria não é florão, nem ostenta
Lábaro não; a minha pátria é desolação
De caminhos, a minha pátria é terra sedenta
E praia branca; a minha pátria é o grande rio secular
Que bebe nuvem, come terra
E urina mar.
 
Mais do que a mais garrida a minha pátria tem
Uma quentura, um querer bem, um bem
Um libertas quae sera tamen
Que um dia traduzi num exame escrito:
"Liberta que serás também"
E repito!
 
Ponho no vento o ouvido e escuto a brisa
Que brinca em teus cabelos e te alisa
Pátria minha, e perfuma o teu chão...
Que vontade me vem de adormecer-me
Entre teus doces montes, pátria minha
Atento à fome em tuas entranhas
E ao batuque em teu coração.
 
Não te direi o nome, pátria minha
Teu nome é pátria amada, é patriazinha
Não rima com mãe gentil
Vives em mim como uma filha, que és
Uma ilha de ternura: a Ilha
Brasil, talvez.
 
Agora chamarei a amiga cotovia
E pedirei que peça ao rouxinol do dia
Que peça ao sabiá
Para levar-te presto este avigrama:
"Pátria minha, saudades de quem te ama…
Vinicius de Moraes."




terça-feira, 14 de setembro de 2021

O PROFESSOR JOSÉ AUGUSTO DELGADO


 

Na semana que findou tive a notícia do falecimento do eternizado Ministro do Superior Tribunal de Justiça, meu mestre dos bancos do Curso de Direito da UFRN, José Augusto Delgado. Não sei se possuo estatura para lhe prestar homenagem que valha, mas é exatamente isso o que tento fazer agora, através das linhas que ora escrevo com alguma dificuldade emocional e uma muito maior: a de trazer elementos sobre os saberes e a história do homenageado no campo jurídico. Portanto, já peço aos que se dispuserem a caminhar comigo nas alamedas do Campus da UFRN (do final dos anos 80 ao início dos 90), que a leitura do presente texto seja complacente com certas ignorâncias que revelo no caminho do resgate muito mais afetivo do que intelectual das passagens que tive com o grande sábio que partiu.
 
O Professor José Augusto Delgado sempre mereceu esse título com maiúsculas. Nunca tive dúvidas. Nunca. Desde o momento em que o vi ingressando na sala F1 (não sei como me lembro disso e posso até ser corrigido por ex-colegas) e percebi naquele senhor de paletó e gravata, nariz aquilino, com aspecto e convicções conservadoras, a expressão de genialidade que sempre lhe foi marcante. 

Algumas das lembranças que dele possuo, indeléveis, trazem-me de volta instantes felizes vividos nas salas de aula, em que pude vê-lo e ouvi-lo em inesquecíveis lições de Direito e de vida. Nutro a perene certeza de que, além da fala leve, mas realçada quando queria destacar aspectos relevantes do conhecimento jurídico, a sua dedicação e extrema vocação para as tarefas às quais se propunha era algo de saltar aos olhos e atiçar a inteligência. Aliás, ele gostava de uma frase, sempre repetida que terminava com “...fricção de cérebros, de inteligências”.

O que se pode dizer, quanto ao quesito “dedicação” sobre alguém que colocava no quadro da sala todos os seus números de telefone, deixando ao critério dos seus alunos o horário das ligações para extinguirem dúvidas sobre Direito Processual Civil/Teoria Geral do Processo (e um famoso questionário de cem perguntas, que queria ver respondido por todos) a qualquer momento da manhã, da tarde, da noite e...da madrugada?!

Parecia uma excentricidade, mas era fato que estudava os processos e os livros jurídicos até altas horas da madrugada, o que certamente lhe custava receber muitos trotes de estudantes – digamos – animados em festas de finais de semana. Eu nem queria reconhecer isso, não sei se algum dos filhos ou demais parentes (destaco o querido magistrado Magnus Delgado) ficará chateado comigo, mas fui um dos atrevidos estudantes que ligaram para conferir se o Doutor Delgado estava mesmo acordado e lendo. Incrivelmente, às duas da manhã de um sábado, ao telefone muito gentilmente atendido, passei uns quinze minutos ouvindo o mestre discorrer sobre “princípios do Processo Civil”.

Muito tempo depois, tive a honra e a nobre condição de ser seu confrade na Academia Norte-rio-grandense de Letras, presidida pelo seu amigo-irmão Diógenes da Cunha Lima (também meu professor de Direito, na UFRN). Em poucas, mas muito frutíferas conversas, o mestre nos ajudou a encontrar a solução para um entrave na redação do vigente estatuto da Academia. Uma glória pessoal para mim foi ter composto aquela mesa. Ainda tenho vontade de ligar para o Professor Delgado e lhe perguntar sobre Direito e sobre o grande processo da vida, essa que ele conheceu ainda melhor e mais profundamente.

LÍVIO OLIVEIRA



JOSÉ AUGUSTO DELGADO (1938 - 2021)

José Augusto Delgado e Diogenes da Cunha Lima

 

Teve mais que ciência, a consciência do direito. Exerceu cidadania exemplar, como cultor e ensinante. Transmitiu a cidadania como conferencista, jurista, múltiplo doutrinador. José foi homem de belo passado. Dou testemunho: para mim ele representou fidelidade, constância, afeto.

DIOGENES da CUNHA LIMA





quarta-feira, 8 de setembro de 2021

O REPENTE NA ACADEMIA


 



FARDÃO ACADÊMICO

 


Cassiano Ricardo, em discurso na ABL, saudando Menotti Del Picchia, lembra do orgulho que teria o pai por vê-lo “metido no fardão acadêmico só alcançado por poucos, mas ambicionado, secretamente, por todos os escritores, inclusive pelos que mais o ironizam”.