Se você ainda não leu José Paulo Cavalcanti, não sabe o que está perdendo. Em prosa ou em verso, ele atua como propulsor de energia espiritual.
É preciso valorizarmos os bons autores contemporâneos, principalmente
os da nossa região, pois, na ligeireza da época, vence a cultura da
vulgaridade, massificada incultura faz valer essa subliteratura.
Se Deus quiser, José Paulo e sua admirável Letícia (ambos
da Academia Pernambucana de Letras) receberão, no dia 14 de novembro, o título
de Sócio de Honra da nossa Academia, outorgado em Assembleia Geral. A distinção
será entregue na sessão solene comemorativa dos 80 anos da instituição.
O
escritor e jurista J.P.C (F) com o seu filho completam a terceira geração de
advogados que visam à essência da justiça, comprometidos com a ética. Os dois
estudaram na Universidade de Harvard, Sérgio fez especialização em cyberlaw. Lembram Carnelutti: “vamos
dizer as coisas como as coisas são. Quase igual é o mesmo que diferente”.
Otimista
ameno, a vida de J.P.C. é de conquistas. O ex-ministro da Justiça é consultor
da Unesco e do Banco Mundial. Integrou a famosa Comissão da Verdade. Dizem as
boas línguas que ele, convidado pelo Presidente da República, escapou de ser ministro
do Supremo Tribunal Federal. Dizem as más línguas que ele mandou fazer a roupa
da posse, mas foi preterido por exigência demagógica. Não tem um claro
pré-requisito de nascença.
Com
Fernando Pessoa, “Uma Quase Autobiografia”, Livro do Ano da Academia Brasileira
de Letras, obteve disputados prêmios, entre os quais o Jabuti. O livrão, mais
de 700 páginas, parece ter sido psicografado por novo heterônimo do poeta. Publicado
em Portugal, já é um clássico também no Brasil.
Por
último, publica “So Mente a Verdade”,
que vai virar seriado da Globo e está traduzido em várias línguas. São 21
contos, composição que homenageia Neruda, lembrando “Vinte Poemas de amor e uma
canção desesperada”. Lendo, você vai encontrar muito amor e pouco desespero, e
tudo o que foi prometido, ou seja, mistério,
misérias, o inesperado, o trágico, o sublime, sobretudo você vai
experimentar o espanto. Convivências
do bom humor como antídoto das fundas tristezas, incontidas emoções, desconsolo
que não chega à desesperança, mas à final exultação.
Os
relatos não guardam a tradicional estrutura dos contos. Em conteúdo e forma, Zé
Paulo renova, moderniza, inova. Por exemplo, coloca o pico emotivo não no final,
mas no meio do conto. Veste a real idade observada, como Consultor, com leveza
literária, faz do episódio parceiro da imaginação. Arranca personagens da beira
do abismo, ou mesmo, alguns que habitam o abismo.
É
possível sentir o sorriso trágico que eleva o sofrimento integrado à apologia
do ser humano. Por vezes, põe dúvida nos acontecimentos, deixando que o leitor
decida. Porque se trata de A Verdade
Mente So Mente Aparentemente.
Ninguém
pode mudar uma vírgula do texto, até porque o autor não gosta de vírgulas.
Inova colocando-as, adequadamente,
depois do ponto de interrogação: de fato, onde termina a pergunta. O escritor
prefere o ponto para afastar ambiguidades, dar relevo à frase, fluidez e ritmo
marcantes.
Esses
contos são novelas ou romances in fieri.
Lá estão os elementos sugestivos das longas ficções. Na economia verbal,
iluminam nossas perplexidades, devolvem a visão do trágico cotidiano, com
lições que nos podem exaltar. Afinal de contas, importa celebrar, permanentemente, a gloriosa epifania da existência.
Por
outro lado, os gregos antigos amavam o teatro, as tragédias e se edificavam.
Shakespeare
põe na boca de personagem em “Trabalhos de Amor Perdidos”: “vive vida longa
quem tem o coração leve”. É com essa leveza que o contista, como consultor
jurídico, observa a vida. Distingue de uns o pensamento dominante, os que
buscam tranquilizar a consciência, os que agem não pelo que aparentam mais por
inconfessada razão, as surpresas do comportamento humano.
Para
tanto, o autor usa a gostosa linguagem nordestina. Assim, leitor, você fará
breve hospedagem literária em casa pernambucana e verá na sala, flores num jarro, mais, na mesa pé de moleque, bolo de rolo e
queijo de coalho.
Como
tudo acaba, o final do livro é pura memória, sem imaginações: Uma canção
desesperada, pela saudade: morte do amigo.
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