quinta-feira, 23 de dezembro de 2021

LUZES E SOMBRAS DO CASARÃO

 

Eis um romance de costumes do sertão nordestino, pedaço da região Nordeste até então quase invisível, não resgatado.

No arquipélago cultural brasileiro, as ilhas são diferenciadas. O Rio Grande do Norte não tem consagrado, nacionalmente, romancistas nem poetas. Não temos um José de Alencar (Ceará), José Lins do Rêgo (Paraíba), Graciliano Ramos (Sergipe), nem um Jorge Amado (Bahia). Temos, sim, sociólogos e antropólogos que, merecidamente, podemos citar: Câmara Cascudo, Veríssimo de Melo, Oswaldo Lamartine. Juristas são nosso legítimo orgulho, exemplos: Cavalcanti, Seabra Fagundes. Músicos, vale lembrar: Aldo Parisot, Oriano de Almeida, Oswaldo de Souza.

Não somos polo difusor para universalizar o conhecimento dos nossos bons poetas e ficcionistas.

Depois de governar o Estado, Antônio José de Melo e Sousa (1867-1955) escreveu romances de costumes urbanos, dentre os quais Gizinha, sob o pseudônimo de Polycarpo Feitosa.

Agora, o ex-governador Geraldo José de Melo escreve este livro que situou no município de Campo Grande, no tempo antes da internet, uma fazenda de gado. Registra costumes, realça valores sertanejos. Usa a bela e expressiva linguagem do povo, enfim, expõe o glamour do povo interiorano.

Os personagens cumprem valores locais. A coragem, a lealdade, o respeito, a hierarquia, a usança da tradição, a repetição de gestos herdados. O comportamento é ditado por um verdadeiro código de honra, que protege e conduz a vida diária.  São retratados heróis, o super-herói que ouve até o silêncio, Tonho do Umbuzeiro e alguns anti-heróis. O pior destes, Tubiba, recebe o castigo merecido. Passarinho, o matador profissional, tem a virtude de bem trabalhar nas lides do campo.

A sensação que tem o leitor é que Deca, Luiz do Caroço, Paulão do Jatobá, o corajoso Bastião da Lagoa Grande e sua fogosa Nativa eram personagens em busca de um autor. Eles estavam no Umbuzeiro sem que ninguém os vissem ou ouvissem. Com rara maestria, Geraldo fez com que vivessem. Quem poderá deixar de pensar em Calixto, aquele que mandou fazer o seu próprio túmulo em frente à casa grande, porque não desejaria, no cemitério, ficar no meio de gente desconhecida?

O episódio da cascavel com Bastião e Tonho é uma verdadeira obra-prima. Confira o leitor.

O texto é feito com poesia e bom humor. Vive o microcosmo de fazenda, é autossuficiente. A narrativa é rica nos conflitos da interrelação pessoal. Revela um modo de ser de uma parte do Brasil, que deverá ser conhecida dos brasileiros. Tudo é dito com verdades miúdas, inseridas em episódios singulares que dão luzes e sentimentos universais. O leitor termina por reconhecer a nobreza do viver sertanejo, que, muitas vezes, tem sido apresentado de forma caricata, intencionalmente deformada.

Encontramos saberes e dizeres do povo, os quais devemos guardar e refletir. Um deles: “Falta muito pouco para não faltar nada”. Onde coronelismo impera: “Até para morrer é preciso pedir licença ao Coronel Ananias”. Já o protegido dele, o delegado Messias, destaca-se por ser “lento de passada e de pensar”.

A força emocional é bem notada: “A emoção não se vê, se mexe, entra e sai das pessoas”. Donana, a mulher do herói principal, tem respeito e confiança, como se preceito religioso fosse, pelo marido a quem chama de seu, Seu Tonho: “Abaixo de Deus, confio no senhor meu marido”.

A gastronomia está presente. A dona do casarão comanda na cozinha. É possível sentir o gosto de cascão de queijo na farofa, adoçar com raspa de rapadura a coalhada e o café, o queijo endurecido cozinhado no feijão, a manteiga de garrafa que melhora os sabores. Na quase ausência de frutas, a alegria da gogoia.

A expressão linguística tão nossa é desconhecida na cidade grande: Inhô-sim. Para expor fato negativo, afastando do falante: Lá nele. Não se diz lajedo que é de gente culta, o preferido é lajeiro. Tudo isso vale um garajau de rapadura.

O enredo leva o leitor à participação. Nós entramos num mundo real porque refeito, revivido, em movimento.

Geraldo Melo é inquieto, buliçoso, amante do povo com quem aprende. Muito planejou. Fez nascer uma lúcida geração de planejadores no Estado. Foi diretor brasileiro de empresa internacional de economia, com sede na Inglaterra e também no Japão.  

No exercício do mandato de senador e como vice-presidente do Senado, teve reconhecida a sua atividade inteligente, vigilante e ativa.

Representou o Brasil e o Parlamento brasileiro na Conferência dos Presidentes do Senado do Mundo, em Roma, e em Paris (2002), no qual foi escolhido para fazer o discurso de abertura.

Geraldo Melo é visionário empreendedor, aberto a novas ideias, busca melhorias na mudança.

Tornou verdadeiro o clichê de diplomas de louvação. É um cidadão que tem prestado e presta relevantes serviços ao Estado e à Nação Brasileira.

Aqui, certamente, inicia uma nova etapa de sua produção, a de romancista. Não tenho dúvidas do seu êxito. O seu romance “Luz e Sombras do Casarão” tem a dimensão de garantir a aquisição de leitores em todas as partes do país.

Vale!

DIOGENES da CUNHA LIMA




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