sexta-feira, 24 de junho de 2022

FOGUEIRA de SÃO JOÃO

 


No castiçal da saudade
eu guardo a recordação
das brincadeiras de roda
na fogueira de São João.
 
Com milho assado e canjica,
fogo de roda e balão,
vai passando uma e vem outra
fogueirinha de São João.
 
Cantando criô-lá-lá
e anel de mão em mão,
moça e rapaz se amando
na fogueira de São João.
 
As estrelas lá no céu,
piscando, olham este chão,
se assemelham às fogueiras
das noitadas de São João.
 
A juventude passada
fazia adivinhação
com faca na bananeira,
na fogueira de São João.
 
Até mesmo o vaga-lume
com seu bonito clarão
também vinha admirar
as noitadas de São João.
 
Na fogueira de São João
se fazia a brincadeira
das cantarolas de roda
com ciranda... a noite inteira!
 
Cantando Vestido Branco
e anel de mão em mão.
Oh! Meu Deus como era bom
As festas do meu sertão.
 
Enchia-se bacia d’água,
pegava agulha e carvão,
dizia-se os nomes das moças
bonitas do meu sertão.
 
Um tiquinho das comidas
sempre guardava... um bocado
botava em baixo da rede,
sempre sonhava acordado.
 
A fogueira incendiava,
ficava aquele brasão,
pisava e não me queimava,
tinha fé em meu São João.
 
Da minha infância querida
só tenho a recordação
das noites iluminadas
com fogueiras no sertão.
 
As tochas das mariposas
causavam admiração...
Lá no céu também faziam
fogueiras de meu São João.
 
Chuva de ouro e de prata,
cara dura com balão...
Nas festas mais animadas
brincavam com foguetão.
 
Na fogueira de São Pedro
voltava a competição
de compadres e comadres,
como se fosse o São João.
 
Lá no clarão da fogueira
se brincava de limão,
de prendas e de berlinda,
também anel de cordão.
 
Cantava-se assim:
- O limão que anda na roda,
andando de mão em mão,
lesa o menino, lesa
o pobre do bestalhão.

NILSON de BRITO 
(1929 - 2019)



Um comentário:

  1. NILSON DE BRITO, O HOMEM, O POETA (1929 - 2019)


    "A vida é uma constante ilusão. Nascemos, crescemos e quando já temos um grande rol de pessoas caras, sejam familiares, sejam amigos, a morte traiçoeira e arrebatadora começa a fazer os seus estragos”. Assim escreveu Nilson de Brito, o Capitão, no prólogo de um de seus livros, e ao fazer essa confissão deu a público a radiografia da sua alma: foi um homem simples, sem ambições materiais, mas sabia exatamente onde estava a fortuna que carecia para bem viver.

    E essa fortuna outra não foi senão a que, mais do que ninguém, ele soube amealhar. Em verdade, foi imenso o patrimônio que formou, um patrimônio afetivo, à base de parentesco e de amizades.

    Em suma, o Capitão foi um homem do povo e pelo povo. Era patente a sua predileção pelos humildes; estava sempre ao lado dos menos favorecidos. Humano, demasiadamente; intransigente, se diante da falsidade ou desonestidade.

    Ele próprio foi uma espécie de eco da boca das ruas, do canto dos poetas cordelistas de todas as eras, famosos ou esquecidos.

    As fontes que mais lhe influenciaram a formação foram a boa prosódia dos alpendres, a oralidade dos violeiros e a literatura de cordel romanceada. Por meio desta lhe foram inculcadas as noções rudimentares da ciência, as datas e os nomes dos vultos da história, os princípios básicos da geometria e da matemática e, com muita fartura mesmo, informações sobre a nossa geografia física, econômica e humana.

    "Vou andar pelo mundo!", disse para si, muito cedo, atraído pelas notícias de outras ribeiras. Deu no que deu, no que ele se entendia que era: um self-made man , ou la même chose (isso, em francês, ele aqui diria!), um homem que se fez por si mesmo.

    Era um mensageiro da alma nordestina, dando-nos notícias de João Grilo, de Cancão de Fogo, de Pedro Malazarte, do Pavão Misterioso e de toda uma comunidade de heróis do romanceiro popular.

    Sabia da sua aptidão para encantar. Aliás, tinha o divino dom de conversar com uma criança com a mesma empolgação que falava com um sábio.

    Da sua coleção de adágios, sempre uma pérola de como proceder, dada essa ou aquela situação embaraçosa, era sugerida ao interlocutor, e fazia questão de ilustrar a eficácia da lição com vivências próprias, enriquecendo-a com sua particular maneira de enxergar o mundo, e essa forma de ensinar foi um diferencial da sua mestria.

    Compôs músicas, criou escolinha de futebol, contou muitas estórias, foi tabelião público, escritor... e influenciou o destino de muita gente.

    Nesta data tão festiva


    Encantou-se em 24 de janeiro deste 2019, um ano de muitas chuvas a mais!
    Quem sabe venham do coração de algum anjo gotejador de inverno, desses com quem o Capitão agora proseia e encanta pelas veredas do Céu!

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