terça-feira, 26 de janeiro de 2021

POR TODA ETERNIDADE




Porto Alegre, 1983. O Hotel Majestic colocou Mário Quintana no olho da rua. A miséria havia chegado absoluta ao universo do poeta. Mário não se casou e não tinha filhos. Estava só, falido, desesperançoso e sem ter para onde ir. O porteiro do hotel, jogou na calçada um agasalho de Mário, que tinha ficado no quarto, e disse com frieza: - Toma, velho! Derrotado,  recitou ao porteiro: - A poesia não se entrega a quem a define.

Mário estava só. Absolutamente só. Onde estavam os passarinhos? A sarjeta aguardava o ancião. Alguém como Mário Quintana jogado à própria sorte! Paulo Roberto Falcão, que jogava no Roma, à época, estava de férias em sua cidade natal e soube do acontecido. Imediatamente se dirigiu ao hotel e observou aquela cena absurda. Triste, Mário chorava.

O craque estacionou seu carro, caminhou até o poeta e indagou: - Sr. Quintana, o que está acontecendo? Mário ergueu os olhos e enxugou as lágrimas - daquelas que insistem em povoar os olhos dos poetas - e, reconhecendo o craque, lhe disse: - Quisera não fossem lágrimas, quisera eu não fosse um poeta, quisera ouvisse os conselhos de minha mãe e fosse engenheiro, médico, professor. Ninguém vive de comer poesia.

Mário explicou a Falcão que todo seu dinheiro acabara, que tudo o que possuía não era suficiente para pagar sequer uma diária do hotel. Seus bens se resumiam apenas às malas depositadas na calçada. De súbito, Falcão colocou a bagagem em seu carro, no mais completo silêncio. E, em silencio, abriu a porta para Mario e o convidou a sentar-se no banco do carona. Manobrou e estacionou na garagem de um outro hotel, o pomposo Royal. Desceu as malas. Chamou o gerente e lhe disse: - O Sr. Quintana agora é meu hóspede! Por quanto tempo, Sr. Falcão? - indagou o funcionário. O jogador observou o olhar tímido e surpreso do poeta e, enquanto o abraçava, comovido, respondeu: - POR TODA ETERNIDADE.

O Hotel Royal pertencia ao jogador! O poeta faleceu em 1994.





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